[Ficção] O meu pior
É sobre o tempo que escrevo, esse tempo que anda à deriva, nesse balançar do passado que não regressa.
Há horas em que sumo, parto deste mundo, desta Terra que me abraça e faço expedição a outro universo. Não me sinto ser merecedor para pisar este chão que também tu pisas. É como se me doesse a alma por já não te pertencer, é como se a minha existência já não fizesse sentido.
Fui o barco naufragado no teu porto, fui a maré dos teus sonhos e deixei-os morrer.
Não há direito, eu não mereço sequer que existas como memória, fui uma marca na tua história que deverias apagar para sempre. Errei, redondamente, tenho noção disso.
Fui hipócrita, pouco generoso e nada humilde, revoltei-me com o que me rodeava e levei-te comigo. Fui mau, presunçoso e perdi o que de melhor encontrei na vida: tu.
Tu que compreendias tudo aquilo que sentia, tudo aquilo que não sabia dizer. Eu disse-te e não menti que não fui feito para amar, ainda que tu me tenhas ensinado. Mas será o amor algo que se ensine? Ou se sente e pronto?
Só sei que agora, depois de querer morrer e renascer de novo é que aprendi que o amor é esta dor da ausência, é este querer o teu bem, é saber que estás melhor sem aquilo que te dei do pior de mim, é saber que te quero ver feliz mesmo ao lado de outro alguém se isso te tornar completa, é aceitar que os nossos caminhos se separaram porque eu errei, e amar também é isso: aceitar que errei. Pôr um ponto final à corda do relógio que nunca mais deixa de regressar àquilo que fomos e por fim, deixámos de ser.
Amar é lamentar, é pedir desculpa, ainda que não seja aceite.
Amar é também aceitar e seguir em frente.