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Gesto, Olhar e Sorriso

Palavras que têm vida.

19
Dez17

[Ficção] É mais fácil morrer que partir.

Carolina Cruz

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Não sei porque escrevo para ti. 
Não sei porque é que repito tantas vezes para mim mesma que, no próximo ano, sairei do cerco em que me aperto todos os dias. 
Sim, vivo enclausurada nesse abraço teu que já não existe em mim, beijo-te em sonhos e toco-me lembrando-me de ti. Sinto-me inutil quando o faço, quando penso, quando ajo, sinto-me suja, impura e magoada. 
Sinto uma dor no peito e um vazio que me domina. Eu já não sei quem sou, mas sei o que era e deixei de ser por ti, hoje sou apenas a mágoa num corpo, despido e morto, rendido ao passado e ao que não volta mais.
Olhava para a depressão de alguém com desdém e pensava: "morrem amores, mas a vida continua".
Agora que penso nisso, choro, julguei e tornei-me igual, partilho da mesma dor, do mesmo sofrimento.
Eu sei, é verdade que a vida continua, mas a alegria não. Falta-me esse teu abraço, o teu cheiro nos meus lençóis, o teu regaço no meu peito, o teu amor por completo. 
Dispo-me da pele da mulher que amavas, estou nua de vaidades, nua de prazeres, de esperança. 
Morro, porque já não quero existir, mas não morro inteiramente hoje, vou deixando apenas que o tempo, que dizem que cura, me faça aprodecer aos poucos, para me levar, por fim. 
Assim acabarão as dores e o sofrimento de te querer e não estares, de te respirar e já não existires. 
Assim não existirei sem ti. 
E sem ti... 
É mais fácil morrer que partir.

02
Ago17

[Ficção] Corpo morto e só

Carolina Cruz

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Morreste-me nos braços.
Foi praticamente isso.
Foi exatamente isso que senti.

Fiquei sem ti, fiquei sem chão.
Quem sou eu sem ti? Onde estou? Como sou?
Vagueio-me e deixo-me fugir, andar somente por aí.
Partiste sem uma palavra, uma desculpa ou um perdão.
Eu não merecia isto.
Eu não merecia isto.
Não, repito, não merecia.


Dói-me o peito só de pensar.
Respirar era essencial, agora sinto que nem disso preciso.
Não preciso de nada sem ti, não quero mais nada.


Morreste-me.

Perdes-te, perdi-te, perdemo-nos.
Tudo fomos, nada somos, nada mais seremos.
Tu escolheste, tu partiste, tu foste sem mim.
Tu quiseste, tu viverás bem assim.
Mas então porque me falta o ar desta forma se não mereces?
Não entendo.
Não te entendo.
Não me entenderei nunca por te ter amado assim.
Morro sem nada, vivi com tudo, contigo.
Sou uma levre brisa que assenta no tempo,
Sou pó,
Corpo morto e só.

21
Jul17

Tenho medo de morrer

Carolina Cruz

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Vem buscar-me e levar-me embora deste terror.
Aparece à minha frente e abre os braços. Abraça-me. Deita-te no meu peito. Embala-me, faz-me sonhar e acreditar que é possível.
Vem…
Tenho medo de morrer. Não propriamente de morrer, mas de morrer sem amar.
Anda, mostra-me que tudo pode ser diferente. 
Mostra-me que no passado tudo estava errado. 
Tenho medo de morrer sem nunca ter amado inteiramente ou morrer de amor inflamado.
Tenho receio, vivo receada por não saber amar, tenho medo do amor.
Por isso vem. 
Vem provar-me que outrora não era amor, que não gostei de amar porque simplesmente não amei.
Vem tirar-me deste vazio, abre os braços e aceita-me, beija a minha pele, sente o meu desconforto, seca as minhas lágrimas, pega nas minhas feridas e sê cuidadoso, respeita-me, aceita-me e abraça-me. 
Prova-me que o amor é algo bom, que nos mantém vivos.
Aproxima-te e não te afastes. 
Abraça-me e nunca mais me largues.

 

 

 

 

08
Jul17

[Ficção] O meu corpo

Carolina Cruz

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O meu corpo sujo nas tuas mãos. 
Ou serão as tuas mãos sujas no meu corpo? Não tens direito... Não tens direito de me magoares assim, de achares que tenho de estar ciente e sabedora de que eu sou a culpada, que te provoquei, a estas horas, com a roupa que trazia vestida. O tanas. 
As tuas mãos sujas no meu corpo. Não tens o direito, não tens de ser portador do prazer se eu não o quero contigo. Só porque és homem? 
Essas mãos sujas não mandam em mim, esse olhar de "eu mando, tu obedeces" há de morrer, não comigo, contigo. 
As mil facas espetadas no meu coração, sentidas no meu corpo, são embaladas para outra alma, qual a tua...? 
Embora não a tenhas, essas facadas que te dou (agora que prometo matar-te para não morrer por ti) são as imensas dores que toda a vida me deste. 
A violência doméstica não é apenas bater. Há muitas formas de cuidar e muitas formas de dizer "quero que morras", mil formas de se ser maltratado, de sofrer violência. 
O meu corpo sujo, repudiado de ódio e rancor, não existe mais nas tuas mãos. Essas tuas mãos sujas morreram na ação, numa justiça feita pelas minhas mãos carregadas de medo, na busca de proteção, na busca de um futuro sem ti. 
Jamais morrerei por ti, por isso o meu amor-próprio defendeu-se, vi-te morrer nos meus braços e, então, o alívio da minha alma sorriu.
 
 

 

 

 

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