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Gesto, Olhar e Sorriso

Palavras que têm vida.

11
Abr18

[Completas-me] Com a Carolina Franco

Carolina Cruz

Bom dia, sorrisos! 
Pois é, há muito que não fazia esta rúbrica, que eu adoro tanto! Mas está de volta e espero com muitos mais convidados!
Hoje trago-vos um texto a duas mãos forte, daqueles que adoro escrever, que nos deixa inquietos e é tão bom!
Hoje é a simpática Carolina Franco que me acompanha, adorei a sua escrita e foi um prazer escrever com ela. Espero que vocês também gostem!

 

"— Despe-te.
O homem de bigode e cabelo grisalho ordenou, enquanto desapertava a gravata e bebericava o seu whisky. Tremia, como sempre. Há anos que o fazia, mas ao estar na frente de um homem que tinha idade para ser meu avô, continha-me. Tinha medo, todas as noites. Medo que fossem tão brutos a ponto de matarem-me. Não era a primeira vez que acordava num quarto de hospital, depois de dias em coma. Não era a primeira vez que injetavam-me heroína e quase morri de overdose.
— Vá, querida, aproxima-te.
Deixei cair o vestido curto vermelho, no pavimento flutuante que custava mais do que todos os meus serviços, numa semana e sentei-me no seu colo. Desprezava-o. Sentia um nojo imenso. Tresandava a álcool e sexo. Rasgou-me a lingerie e atirou-se juntamente comigo ao chão. Penetrou-me. Arrancou de mim toda a inexistente inocência. Gemia alto. Quando chegou ao clímax parou e retirou aquele pedaço insignificante do meu corpo. Atirou-me duas notas de 20 euros, fechou o zíper das suas calças finas e saiu."

 

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O que eu não faço para ter a minha vida de volta… quanto nojo e sémen há em mim. Ele vai voltar, como voltou tantas noites e eu vomito mal ele sai, queria poder vomitar todo o passado em mim, queria deitar fora todas a minha essência, as minhas entranhas, morrer para voltar a nascer de novo.
Vim para esta vida para ganhar algum, sou uma mulher nova, diziam que eu era bonita, outrora sim eu era, hoje não passo de um trapo que despeja o corpo para se dar a cada diabo que morre por uma boa fornicação e eu que só quero ganhar um vencimento para poder ter o meu filho de volta.
Eu sei que muitos condenam as voltas que a vida dá, a minha escolha, a forma de procurar o meu melhor, mas não fui eu que o escolhi, prometeram-me mundos e fundos, que me davam uma vida melhor noutro país a servir às mesas de gente rica e poderosa, a mesma gente que me lixa e me penetra.
Eu só quero o meu menino de volta, só quero o Guilherme nas minhas mãos e se ele já não me conhecer? Se ele já não me quiser na sua vida?
Tive-o com 16 anos, aos 18 retiraram-mo, arrancaram-mo do colo, mas nunca mo tirarão do coração, do ventre, de cada pedaço do meu corpo, é por ele que me sujeito à morte e se ele não me quiser, eu escolho ficar, escolho a dor, prefiro morrer.

 

 

04
Fev18

[Completas-me] mais uma vez com a Sofia Alves Cardoso

Carolina Cruz

Pois é, cá estamos de novo. Este "Completas-me" não é um "completas-me" qualquer. Este vem a pedido de muitas pessoas que após lerem o texto da semana passada (a meias com a Sofia) pedirão que repetissemos a dose, e cá está mais um texto a duas mãos. Desta vez comecei eu! Espero que gostem!

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Revejo-me nos teus olhos a chorar e é tão bom! Adoro ver-te assim, inundada de dor… depois de me matares por dentro, me traíres, de voltares para aquele cabrão que te amou sem dor, feito de sorrisos e cenas pirosas, como o amor deve ser, lamechas… como tu gostavas que eu tivesse sido nos dois anos que estivemos juntos. Sempre me mentiste não foi? Sempre o quiseste de volta, não foi minha querida? Hoje, amarrada à minha cama, pedes compaixão. E essa dor com que me devoraste o peito quando para ele voltaste, achas que não doeu? Foste fraca, cedeste a todos os seus caprichos, agora vais ceder aos meus, vais amar-me, ainda que contrariada, vais amar-me e vou lixar-te a vida. Vou mostrar-te como dói o amor que sinto… Vai doer sem compaixão, vou amar sem medos de te magoar. Tu sabes como é… Não é meu amor? Revejo-me nos teus olhos a chorar, na tua boca a gemer, no teu sangue do nariz a escorrer. O que quero de ti afinal? "Não faças perguntas tontas! Tu bem sabes o que eu quero de ti. Quero aquilo que tu nunca me deste: amor. E não quero um amor qualquer, quero o teu amor assolapado, quero o melhor de ti, como se não existisse nada maior neste mundo. Quero que me ames até aos confins do planeta e que te dês a mim completamente. É pedir muito? É pedir muito que me agarres e me abraces, amparando os meus brados e os meus medos? Tu nunca me amaste, pois não? Nunca sentiste um laivo de amor por mim e enganaste-me, mantendo-me aos teus pés. E para quê? Para eu me sentir uma marioneta nas tuas teias inquebráveis? 
Revejo-me nos teus olhos a chorar e é tão bom… É tão bom ver-te como eu me vi há anos, e como me vejo agora. Porque nada disto amaina a minha alma e cala os meus pensamentos ruminantes. Por que é tão difícil? Pensei que provocar-te dor me saberia como água após dias num deserto. Mas não. Toma a faca. Faz o que quiseres."

02
Mar17

[Completas-me] Com Cátia Cardoso

Carolina Cruz

Hoje, o completas-me veio à quinta-feira, mas o importante é vir e ser bem recebido, partilhado.
Hoje tenho o grande prazer de partilhar a escrita com a talentosa e comunicadora Cátia Cardoso, autora do livro "Linhas Delicadas" (visitem, vão adorar as suas palavras)
Apresentamos um texto simples mas com uma mensagem muito importante: "seguir os sonhos".

 

“É frio o vento. Sopra com cada vez mais força. Os minutos passam e ela permanece no mesmo local. O anoitecer deu-se e ela ali ficou, a contemplar o vão, a fundir-se em pensamentos aleatórios e masoquistas. As lágrimas são cada vez mais espessas e geladas, porém, nada as afaga. Talvez, se tivesse nascido noutro sítio, noutra família, noutro século, noutro contexto... talvez, de uma forma diferente, tudo pudesse ter sido diferente e ela não tivesse de estar agora ali a lamentar-se pela sua pouca sorte.
Não há nada que a conforte. O céu parece preparar-se para que chova. É inverno, estava à espera de quê? Que um sol raiasse e a permitisse ficar ali toda a noite? Começa a chover, porém, ela não procura abrigar-se. Na verdade, nem se move. Permanece estática como se estivesse à espera que alguém lhe dissesse para sair dali e ir abrigar-se. A chuva molha as suas roupas, e funde-se nas lágrimas que lhe atravessam o rosto. Que horas serão? Dez da noite? Meia-noite? Três da madrugada? Perdeu a noção do tempo, e, sem querer, da vida. Está encharcada e parece não se importar com isso. Embora o frio seja cada vez mais incomodativo, nada a faz mover-se. É como se estivesse morta. Morta para a vida. Que outra morte existe, afinal?”

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Morremos se estagnarmos, morremos se nos acomodarmos, se nos permitimos parar. Nada mais existe em nós, depois de morrerem os sonhos.
Ela sentia-se como que uma alma vã que atravessava o mundo. Já não existiam razões para viver.
Porquê? Porquê aquilo acontecer? Porquê ela? E mais… porque é que ao morrer um sonho, ela morrera também ao invés de lutar por ele? Os sonhos só morrem se desistirmos deles. E ele só tinha morrido porque ela o matara ao não acreditar mais.
Chega de pensar e se… Se ela vivesse em outro lugar, noutro tempo, iria lutar da mesma maneira? Ou melhor, não iria lutar? O que queria ela? Receber tudo de mão beijada? Talvez fosse mais fácil, talvez soubesse bem receber e concretizar tudo o que sempre devera ser seu por direito. Mas não, não teria o mesmo sentido. Tudo é melhor se assim não for, tudo tem um sabor maior depois das quedas, depois de saber que o que temos foi por mérito próprio.
Houve uma voz, que lhe deu essa luz, que lhe disse que ao sentar-se e se lamentar não iria trazer o seu sonho de volta, não ia dar-lhe o que mais queria. Que lamentar só traz pensamentos negativos, dores na alma e moleza do corpo. Sem a força que o alimenta, ela morrerá por completo e sim, assim sendo os seus sonhos também morrerão.
Então ela deu-lhe razão, deu as mãos a esse pensamento positivo e mudou o seu destino.
Terá ela concretizado os seus sonhos? Pelo menos ao pensar de forma diferente, terá tido uma maior chance. 

08
Fev17

[Completas-me] com Cátia Madeira

Carolina Cruz

Hoje temos a querida Cátia, do blog "Em busca da felicidade" com um texto a duas mãos que é tudo menos feliz, no entanto, acredito que vos vai apegar do início ao fim. Espero que gostem tanto, como eu gostei desta parceria!

 

"As lágrimas que caem no meu rosto seguem o compasso das ondas que batem fortes na areia da praia. O som que me acalma os pensamentos. O coração. Os sentimentos. Tento acertar o bater do meu coração mas está descontrolado.
A mala a meu lado. Dois tarecos e meio. A saudade cá dentro. O medo de perder quando sei que fui eu que fugi.
Não queria ter virado costas. Pediste que ficasse. Que tudo se resolvia.
Resolvia?
- Às vezes parece que já não nos conhecemos.
- Mas como, se ninguém me conhece melhor que tu?
Como? Se nem eu me conheço como tu sabes o que sou? Como posso achar que já não nos conhecemos.
A minha cabeça. As minha dúvidas. A minha procura pela perfeição.
Não sei se te faço bem. Se sou o melhor para ti.
- És quem eu quero. Deixa-me ser eu a escolher.
Escolhi por ti. Bati a porta e saí.
O caminho não sei como o fiz e dei comigo em frente ao mar. Aquele que me lava a alma. Aquele com que acerto as batidas do meu coração. Aquele que espelha as lágrimas que trago no rosto. Dois mares salgados frente a frente. Um puro, outro ensombrado pela dor de quem escolheu da pior forma. De quem quer voltar atrás mas não tem coragem para isso.
Escolheste vir embora. Agora não podes voltar sem mais nem menos.
A minha mente comanda. O meu coração obedece.

Sinto passos atrás de mim. Como quero que sejas tu. Como quero que me abraces e me digas que tudo vai ficar bem. Que me amas mesmo louca. Que me envolvas nos teus braços. Ponhas o teu casaco sobre os meus ombros e pegues na minha mala.
- Vamos para casa. – dizias – para nossa casa.
E eu ia contigo.
Se me conheces como sei que sabes quem sou, encontras-me aqui. Neste espaço que me acalma as batidas do coração."

 

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Mas não, não eras tu. Nunca serás tu, depois de toda a desilusão que prendi em ti, nunca serei eu de volta ao teu coração. No entanto, no meu coração estarás sempre até ele deixar de bater. Apesar de tudo, amo-te. E o meu coração só deixará de te amar quando tudo terminar.
É isso, é isso mesmo. Quero que ele deixe de bater, já, agora.
As ondas estão revoltas, o mar está bravo, dispo a roupa, tal e qual como gostavas que me despisse para ti, ali estava o meu corpo nu a amar-te como uma louca, como se as ondas fossem a tua cama, como se o mar fosse o meu crematório.
Entrei a medo, a água gelada quebrou o meu corpo quente, naquele inverno frio. Não podia desistir, eu tinha sido fraca toda a vida, mas naquele momento tinha de ser forte, quebrar tudo, quebrar-me a mim. A louca não partira apenas da tua vida, mas do meu corpo também, partira para sempre.
O meu corpo começava a gelar, os meus pés não viam o fundo e eu via o meu fim à vista, estava a conseguir.
Estava prestes a perder os sentidos, quando ouvi uma voz dentro de mim, eras tu, a tua voz doce, que me fazia recuar, mas já não conseguia, os meus olhos já se tinham fechado.
Eras mesmo tu e não uma voz dentro de mim, eras tu que me agarravas, e choravas, só a minha alma te podia ver, o meu corpo já não te podia tocar.
Chegaste tarde demais, e eu parti demasiado cedo. Não devia, desculpa. Hoje choro, mas não serve de nada. Será que se arrependimento matasse, eu voltaria a viver?
Por vezes não entendemos que os nossos atos magoam os outros. Eu marquei-te e magoei-te para a vida toda, deixando partir a minha.
Sei que esse teu corpo é só apenas uma miragem, porque também desejas partir nesse mar, mas pensa em mim, e sempre que quiseres, se isso te liberta, vem lembrar-me, encontra-me aqui, talvez um dia quando houver pozinhos mágicos, eu possa voltar.

  

16
Nov16

[Completas-me] Com a RP

Carolina Cruz

Hoje o "Completas-me" está de volta! Finalmente! - devem dizer vocês. É verdade, mas como disse no facebook, eu não gosto de fazer as coisas à pressa, mas sim dedicar-me de todo o coração àquilo que abraço. E esta rúbrica, como todas as outras, merece a minha perfeição, e como ela não existe, eu procuro dar o meu melhor. 
Hoje trago-vos a minha querida e simpática RP para um texto sobre quebra de monotonia e mudanças. E é engraçado que esta história fez-me sonhar que estava num avião com ela, não é curioso? :D

Vamos ler? Espero que gostem desta história escrita a duas mãos!

 

"Agora que o avião colocou as rodas no chão é que caí em mim. O meu estômago embrulha-se, tal é a minha ansiedade. Constato, agora que estou mais lúcida, que pouco me falta para ter um ataque de pânico. Mas onde é que estava com a cabeça? Como fui capaz de largar toda uma vida? Uma bagagem? Os amigos? A família? Os meus pais choraram tanto. Disseram que todos temos segundas oportunidades. Que fugir não é solução, nunca é! Não concordo. Acho que a pior das hipóteses era ficar. Voltar aos mesmos lugares, ver as mesmas pessoas. A cabeça quente achei que sair do país era o ideal. Mas não para a Europa já com um emprego e uma casa garantidos para os tempos de adaptação. Conheceria alguém. Isso resultaria em familiaridade, em questões, em voltar ao mesmo. Não queria isso. Tudo menos isso... Talvez o meu pânico se deva a sair da zona de conforto. Ao facto de não conhecer ninguém a quem recorrer, a não conhecer o lugar. Ou a ambos. Que raios! Lancei-me de cabeça. Nem sequer o idioma sei. Não tenho emprego. E se não arranjar? Não tenho conta bancária para uma estadia demasiado longa.   As portas do avião abriram. Nem sequer sei onde é a saída do aeroporto. Sigo a multidão. Faço neste momento parte do rebanho. Eu que sempre fui contra isso, que sempre me revoltei com as imposições. Aliás agora que penso nisso lembro-me das pessoas que tanto dececionei. Os meus pais que sempre batalharam para me darem uma vida estável. E cujas regras sempre me obstinei a cumprir. Os meus amigos que sempre me deram um apoio e conselhos e eu largo-os. O meu cão, até ele que tanto gosto dececionei ao não o trazer comigo. Todas as relações falhadas que tive. Não culpo nenhum deles. Culpo a minha pessoa, a insatisfação crónica, o só querer estar onde não estou... Eu fui a pessoa mais dececionante que lhes poderia passar na vida. E nenhum deles merece. Estão táxis à porta. Rabisco o nome do centro da cidade e mostro ao taxista que acena com a cabeça como quem diz que entendeu. Olho pela janela e reparo em como tudo é tão novo, o que me entusiasma, e tão estranho, o que me aterroriza ainda mais. O taxista deve ter reparado na minha cara porque o ouço a dizer com um sorriso encorajador: "No worries miss. It's safe!" Deve pensar que o facto de já terem sido alvos de terrorismo me amedronta. Como se isso não acontecesse cada vez mais na Europa. Olho para ele e devolvo o sorriso. Tenho mais medo da minha pessoa para ser sincera. Deixa-me no centro, pago e agradeço com a melhor pronúncia que consigo arranjar. Olho à minha volta. Toda a gente passa, todos se conhecem, todos parecem seguros para onde vão, todos estão no seu mundo, ninguém repara em mim. A pergunta que me assola é: "E agora? Para onde?".

 

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Sinto-me perdida, mas já que tomei esta decisão, não posso tornar-me mais cruel comigo mesma. Sei que ainda guardo os últimos tostões e se conseguir ainda me dão para alguns dias, mas não muitos. Trago a guitarra comigo. Faz tanto frio, estou encasacada como uma esquimó. Pareço uma idiota. Decerto haverá por aqui pousadas baratas. “Caramba” – penso – “Nova Iorque é um mundo e eu sou uma formiga em cada rua que passo”. Estou enganada, aqui ninguém se conhece, como vou eu conhecer alguém? Merda. Todos os pequenos seres são formigas que olham para o seu umbigo. Ainda agora cheguei e sinto-me impaciente, não quero isto, mas também não quero ceder aos meus medos. Creio que também eu olhei apenas pelo meu umbigo, e quando julgava que perdia o mundo, por perdê-lo a ele, por estupidez minha, perdi na verdade todos os que tinha à minha volta. Como voltar atrás? Como fazer diferente?
Agora não posso, e para me deixar de consciência tranquila vou fazer o melhor por mim. Se a vida me desse uma segunda oportunidade para amar eu seria a pessoa mais recompensada do mundo e então todos os meus fantasmas partiriam, mas a vida não é como nos filmes.
No exato momento em que pensava nisto, um rosto simpático mergulhado na penumbra veio falar-me… A sua mão pousara no meu ombro.
Com um português misturado num inglês dito a medo, perguntou-me onde podia jantar em conta, sem que precisasse de pagar muito.
Soltei uma gargalhada, não que tivesse piada, mas por instantes não me senti só.
- Eu falo português. – Disse eu depois de parar de rir.
- Uff. – Disse ele soltando um suspiro simpático, acabando por sorrir. – David. – Disse-me, apresentando e estendendo a mão ao mesmo tempo que me oferecia de novo um sorriso. Tinha uns olhos verdes quase da cor de lima e um olhar sonhador.
- Sofia. – Disse, retribuindo o aperto de mão.
Naquele instante em que ele me olhou, eu podia imaginar que tinha acreditado no amor à primeira vista e que o meu coração voltou a sonhar, mas não quis levantar falso alarme. Sim, estava cansada de falsos alarmes, de trair os outros como fiz com ele e comigo também.
- Felizmente não estou sozinha nisto. – Acabei por dizer.
- Quer ir a algum lado? Vamos procurar juntos algum lugar para jantar?
- Se me tratar por tu. Devemos ter a mesma idade.
Curiosamente tínhamos, a mesma idade, os meus gostos, as mesmas vontades, por incrível que pareça – os mesmos escapes.
Dividimos o maço de cigarros que ainda me restava e conversámos sobre tantas e variadas coisas pela noite fora, que parecia que o conhecia há mais de mil anos.
Ele tinha chegado há uns dois dias e andava tão perdido quanto eu, vinha de uma viagem pela Europa, em busca de mudança, vinha com intenções de mudar de vida e gastar pouco, aprender com o mundo, tal como eu fugia à monotonia, mas não me dissera quaisquer razões para a quebrar. O tempo encarregar-se-ia de mo dizer. Eu apenas desejava esse tempo para o conhecer melhor.
- O que pretendes? Ficar?
- Se tiver motivos. Porque não?
Por momentos, na minha inocência parva, sempre a chamar o coração, tive vontade de ser eu esse motivo, mas fantasia-lo, era, por si só, ridículo. Desde que partira naquele avião sentia-me uma louca à deriva, mas encontrar David foi, na verdade, o melhor que me podia ter acontecido.
Porque tempos mais tarde encontrámos razão um no outro para ficar, para ser, para estar. Ele concordou que eu devia fazer as pazes com o meu passado, pedir-me desculpa e depois fazer o mesmo com quem magoei.
Uma amizade verdadeira nasceu entre nós. Ele também era músico amador, mas juntos tomámos a música como opção, começando a tocar juntos nas ruelas, nas ruas mais movimentados, nos metros.
A primeira vez foi por brincadeira e, ao ver que fazíamos sucesso, a brincadeira tornou-se algo mais sério, um sonho, uma mudança no mundo, dos outros e do nosso.
Um ano mais tarde, fomos desafiados por uma discográfica, dividíamos um apartamento minúsculo sem nada haver entre nós, além da amizade profunda. Até ao dia, que o verdadeiro sonho de ambos se tornou real – o palco.
Aquele abraço na subida e no desejo de sorte, desenrolou-se no beijo mais especial de todos os tempos e, naquele momento e em todos os outros, em que a mudança foi a vitória da minha vida, eu agradeci ter partido, ter quebrado a minha tristeza, fugindo da rotina. Embora fugir nunca seja a solução, para mim foi a mudança. Hoje sou alguém bem resolvida com a minha pessoa, com quem sou, como o meu passado. E o meu presente? Com ele é especial, com a minha profissão, com o que somos, com o que temos – o mundo nas nossas mãos – e os seus dois dialetos universais – o amor e a música.

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(fotografia do filme "Walk the line")

20
Set16

[Por aí] No blog "Chic'Ana"

Carolina Cruz

Hoje "Por aí" é numa onda muito divertida, ou não fosse uma publicação no blog da Chic'Ana, como resistir a uma gargalhada? Esta rapariga é o máximo!
Foi um prazer participar na rúbrica "One smile a day", em que a Ana convida um blogger para contar uma situação caricata e cómica que lhe tenha acontecido. Ora desastrada como sou, escangalhei-me a rir, porque, na verdade, não sabia que situação escolher, por isso contei umas quantas. E sobre quê? Autocarros!

 

Quem me conhece sabe que sou um desastre a andar nos transportes públicos, não é que não saiba andar, a cena é que... Tudo o que tem de acontecer, acontece comigo lá dentro, querem um exemplo?

 

«1. Mão entalada

Sim leram bem. Aqui a Carolina ia muito divertida com as suas colegas na gargalhada, apoiada na coluna da porta do autocarro, porque não havia nem lugares sentados e a malta que estava em pé ocupava todas as colunas do meio e eu lá pensei que estava segura… Mas, eis que uma colega minha ao desequilibrar-se toca no “STOP” e na paragem de seguinte a porta abre para ninguém sair, porque foi toque de engano. No entanto, serviu para entalar a minha mão, porque a porta desse autocarro que, ao contrário da maioria, abria para dentro.

Começo a entrar em stress, pois aquilo nunca mais fechava e a minha mão estava a ficar inchada, até que não aguentei mais e gritei ao condutor: “senhor por favor feche a porta, tenho a mão entalada” o problema começou realmente aí, é que a porta não fechava por causa da minha mão lá estar, já pensava o pior, até que consegui com algum esforço tirar a mão de lá, mão essa que me doeu e inchou durante o resto do dia.

Eu sei, é mau de mais!»

 

Querem ler mais? Então cliquem na divertida vinheta que a Ana fez para este post:

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 Obrigada mais uma vez, Ana! Foi um gosto pôr toda a gente a gargalhar!!

 

 

 

24
Ago16

[Completas-me] com Andreia de "O meu poema"

Carolina Cruz

E lá vamos nós, para uma viagem a duas mãos, as minhas e as talentosas mãos de escrita da Andreia, do fantástico blog "O meu poema"
Espero que gostem tanto, quanto eu gostei desta partilha. 

 

“Encosta a porta.
Deixa que o vento te sussurre ao ouvido, enquanto gemem, em rebuliço, os cravos cor de sangue imortal. Deixa que o tempo leve de arrastão as lembranças que entrelaçaram os nossos caminhos. Deixa que o adormecer da madrugada te traga o silêncio de um lampião à escuta, a fuga das estrelas, o sentido das palavras feitas nas entrelinhas.
Lê, uma vez mais, as cartas que eu nunca te escrevi, os beijos quentes de outono, os passeios longos, as conversas banais…
Guarda em ti o nosso pretérito mais que perfeito, onde cabiam todos os sonhos do mundo, uma vida inteira sem último dia, um lugar sem pressa, sem futuro, sem questões.
Depois, quando a estação mudar, não penses mais!
Rasga os versos que escreveste e atira para o mar. Rasga a pele que há em ti e rompe a saudade mordaz que te prende, que te amarra, que te queima, que te destrói.
Denuncia-te!
Levanta os teus sonhos, ao nível dos olhos, e arrasta a poeira de cada calafrio. Levanta-te sem que destruas a história que te deixou ver o amor sem pernas e sem braços, sem dias a mais ou filas de espera. Esvazia o tempo em contrarrelógio, porque houve um dia em que contruímos o nosso castelo na areia, enquanto se deixavam bater, pelas ondas, as memórias de um refúgio antigo, de um desejo secreto, de uma mágoa apagada.
Por agora, agarra bem a almofada. Prende-te à humidade das lágrimas salgadas que irrompem do escuro, do relento de uma alma sem destino, de um ritmo descompassado, de uma angústia em tempo morto, onde a única certeza…”

 

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...é inutil. Cerca-te de uma coisa, de um pensamento que te encaminha à realidade: ele não voltará, como não volta a revolução de Abril. Tal como a história de outrora, ele apenas mora no teu pensamento, em cada recordação tua, do teu passado. Deixa que alguém mais tarde ocupe o seu lugar, ele será apenas uma lágrima, um pedaço de sangue que não te merecerá jamais.

Viveres nessa amargura, é só idiotice tua, não escarneças a tua pessoa. Vive. Abandona todas as dúvidas e segue o teu sonho, aquele que ninguém vivenciará por ti, tu és dona disso, da tua certeza, da tua vida, não deixes que ninguém diga para onde vais, se não é esse o teu caminho. Conta as horas, vive cada segundo e mostra o mundo que não és as muralhas desse castelo mas a rainha que ficou na história não por morrer pelo amado, mas por ser a primeira a vencer a mais terrível das batalhas.

 

29
Jun16

[Completas-me] Com Plutão

Carolina Cruz

Hoje, o "Completas-me" é com Plutão, do blog muito especial Um dia em Plutão que de forma brilhante nos fala com o coração, sobretudo sobre o amor. Se não conhecem, façam-no, vale a pena, assim como a leitura deste texto escrito a duas mãos:

 

"Sophie estava de visita a Portugal, a primeira desde há meio ano que partira para Paris. Conseguiu iniciar a especialidade que sempre quisera, cardiologia, desde sempre que gostava de cuidar dos corações dos outros, já o seu ficara sem tratamento. Foi após ter tomado tal decisão que conheceu Afonso, o rapaz que lhe deixara o coração palpitante. Sophie não desistiu da ideia, queria aproveitar a oportunidade profissional, mas o seu coração viajou apertado sabendo que deixara para trás uma história de amor. Eles pareciam perfeitos um para o outro, mas conheceram-se no momento errado. Sophie estava de volta e com certeza que se cruzaria com Afonso nalgum lugar comum ou por algum amigo em comum. Ansiava o reencontro, seis meses fora não apagaram o sentimento por Afonso, no entanto tanta coisa parecia ter mudado."

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Ele estava diferente, parecia que a tinha esquecido, que tinha outra pessoa no seu lugar, enquanto Sophie nunca ocupara o coração, só tratara o dos outros.
Encontraram-se no bar onde iam todas as noites antes de partir e onde o seu grupo de amigos ainda se juntava. António levara a irmã, Sophie, até eles. O grupo estava animado a conversar. Quando viram Sophie fizeram uma enorme festa, à exceção de duas pessoas que de mãos dadas marcavam o seu amor. Afonso e Ana, uma das melhores amigas de Sophie.
“Vergonhoso” pensou, não lhe disseram nada até ao momento, ela merecia uma explicação, mas depois de os ver só lhe apetecia partir de novo para Paris, já tinha visto que cheguasse.
Sem cumprimentar os amigos decentemente, sem pensar, correu para fora do bar e um mau ambiente ficara no ar.
Lá fora chovia como se o mundo fosse desabar e em parte Sophie acreditava que o seu já estava sido derrubado.
Ao perceber a sua atitude, Afonso largando a mão de Ana correra até Sophie.
- Basta! – Disse ele quando a viu, a chorar por entre a chuva, também ele começara a chorar. – Foste tu que quebraste o nosso contacto, que disseste para seguir com a minha vida.
- Sim, desejosa de que quebrasses essa minha vontade de não te querer magoar, desejosa de que dissesses não, que superavamos tudo até a distância.
- Foste egoísta.
- Fui, mas porque te amava, porque não queria que sofresses tanto quanto na despedida.
- Para mim nunca fora uma despedida, era apenas um até já, mas tu quebraste-o...
- Quebrámos os dois..
- Quebraste-me.
- Tanto quanto voltar e ver-te com uma das minhas melhores amigas. Sinto-me traída. Eu merecia uma explicação, eu merecia uma palavra. Sabes quantas noites fiquei sem dormir? A sonhar que voltavas a entrelaçar a minha mão? Tantas. Estupidamente adormecia abraçada a mim própria, fechando os olhos e imaginando seres tu. E voltar e ver-te noutras mãos, é despedaçar-me a esperança que ainda estava em parte completa.
Ele queria tocar-lhe, entrelaçar as suas mãos nas dela, dizer que não estava certo, que ambos tinham sido egoístas, que ele não amava Ana, que apenas via nela o espelho de Sophie.
Eis que o seu choro intensificou, e perante o seu choro, Afonso correu até Sophie e beijou-a como se de um filme se tratasse. Nada mais importava, quem deixavam para trás, as histórias mal contadas, o egoísmo, a dor, a traição que era apenas fruto do tempo.
Apenas o amor permanecia, naquele momento em que as lágrimas se juntaram num só corpo à chuva, milhares de histórias foram recontadas e o amor voltou a florescer junto dos desejos eternos de viver um dia de cada vez, porque a pior distância é a de um coração partido.

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